Influencer da capivara Filó continua com o animal, ganhou seguidores e contrato com 'bet'

  • 26/05/2025
(Foto: Reprodução)
O caso foi acompanhado por milhões de pessoas, transmitido em canais de televisão e o nome de Agenor chegou a figurar até em sites de fofoca. O influenciador Agenor Tupinambá e a capivara Filó Arquivo pessoal Dois anos depois de protagonizar uma batalha contra o Ibama pela guarda de uma capivara que criava como pet, o influenciador digital Agenor Tupinambá se mudou para um sítio no interior do Amazonas, em Autazes, trancou o curso de agronomia e passou a viver com o que ganha na internet. Levou junto o animal silvestre, que apelidou de Filó. A capivara tinha sido apreendida em 2023 pelo Ibama, por alegações de maus-tratos e exploração animal, gerou comoção do país e voltou a Agenor por meio de uma decisão judicial — o Ibama confirmou que permanece válida a decisão, mas que aguarda o julgamento de um recurso. O caso foi acompanhado por milhões de pessoas, transmitido em canais de televisão e o nome de Agenor chegou a figurar até em sites de fofoca. Para o Ibama, o episódio gerou críticas constantes nas redes sociais, que continuam a cada nova apreensão de animal divulgada. Um analista ouvido pela reportagem (mais informações abaixo) diz que o caso passou uma "mensagem equivocada" à população. Casos como de Filó, que envolvem animais silvestres e influenciadores, se espalharam e hoje geram até ameaças físicas a servidores da instituição, como mostrou a BBC News Brasil nesta reportagem. Para Agenor, portas foram abertas. O influenciador tem hoje 1,7 milhão de seguidores no Instagram e outros 1,8 milhão no TikTok, construídos, segundo ele, a partir da fama alçada com o episódio. "Pelo resto da vida eu vou ser conhecido como o Agenor da Filó, da capivara. Não tem como desvincular isso", disse ele, em entrevista à BBC News Brasil. Entre seus clientes estão empresas da cidade e da região em que vive e também um site de apostas, com quem ele diz manter um contrato anual. O que mudou após a repercussão do caso Tupinambá vive hoje com o parceiro e a Filó em uma casa própria próxima aos pais, e diz que pretende buscar uma nova formação no futuro, talvez em publicidade ou administração. Ele trancou o curso em agronomia, que fazia na Universidade Federal do Amazonas (UFAM). "A internet me abriu portas. Parei meus estudos, mas pretendo fazer cursos, outras coisas. Morava com meus pais na época. Aí comecei um relacionamento. A gente está casado e comprou uma casa no interior, perto dos meus pais. Hoje moramos sozinhos na casa." O influencer reconhece que cometeu erros na forma como exibia o animal silvestre em suas redes. "A Filó fazia parte do meu dia a dia. Eu não via problema em postar ela. Eu já postava o que fazia no interior. Meu maior erro foi ter colocado uma roupa nela e tirado foto. Foi isso que eles consideraram maus tratos. Colocar uma roupa... Isso eu reconheço que eu errei." Ainda assim, critica a forma como foi abordado pelo Ibama à época. "Teria formas de eles terem abordado, de a gente ter conversado. Mas a maneira como abordaram tudo foi muito... não teve aviso, só chegaram na faculdade (UFAM) atrás de mim. Não teve orientações para que eu não postasse." Ele diz que, embora já trabalhasse com redes sociais antes, foi este caso que lhe rendeu um "boom" de seguidores. Nega, no entanto, que faça exploração da imagem da capivara para monetização. "No processo falavam que eu ganhava dinheiro postando os vídeos com a Filó. Consegui provar que nenhuma das minhas redes sociais era monetizada. Nada, nada, nada. Nunca ganhei nada em cima dela, do que eu postava com ela. Depois, meses depois que tudo aconteceu, foi aí que comecei a trabalhar com a internet." Tupinambá atingiu mais do que o dobro do número de seguidores que tinha sido anotado na multa lavrada pelo Ibama, em 2023. Influenciador Agenor Tupinambá contou à BBC que trancou curso de agronomia e hoje trabalha com internet Arquivo pessoal Divulgação nas redes sociais O centro do debate em torno da capivara Filó, e que tem se repetido em outras apreensões do Ibama, é o uso de animais silvestres em redes sociais para gerar engajamento, o que pode estimular a caça ilegal e maus-tratos a esses animais, segundo especialistas. "A gente não pode tocar, fazer carinho, em qualquer tipo de animal silvestre. Mas nunca houve uma restrição de não postar ela", disse Tupinambá. Ele afirmou que, à época, teve de remover todas as postagens em que aparecia em interação com o animal, como em uma que tomavam banho juntos. "Hoje em dia eu ainda posto ela de vez em quando, de uma forma natural. Por exemplo: ela no habitat livre dela, andando no campo, comendo, tomando banho. Até hoje ela vive livre, Filó nunca foi presa. Ela sai, vai pra onde ela quiser." Agenor Tupinambá diz que hoje seu conteúdo é sobre a rotina no interior Arquivo pessoal Conteúdo focado na 'vida no interior' Agenor diz que agora tem focado seu conteúdo nas redes sociais em mostrar o dia a dia no interior e que a capivara deixou de ser o centro das atenções. "O meu conteúdo não era a Filó. Meu conteúdo era mostrar meu dia a dia no interior, Filó fazia parte desse conteúdo. As vezes postava vídeo com ela. Depois que tudo isso aconteceu eu só voltei pra minha rotina, mostrando como é a realidade de ser um ribeirinho no interior do Amazonas, o que a gente enfrenta, a seca, como o rio está cheio agora." Durante o 'boom' de seguidores ele diz que havia muitas crianças que o seguiam, mas que agora o público majoritário é de mulheres. Ainda assim, admite que sempre será lembrado pelo episódio. "Pelo resto da vida eu vou ser conhecido como o Agenor da Filó, da capivara, não tem como desvincular isso. Tá ali, sempre." O engajamento com animais silvestres Tupinambá diz que hoje acha errado que influenciadores tentem ficar famosos com animais e que em seu caso tudo foi mais orgânico, sem um planejamento. "Pra mim foi uma experiência muito ruim, não quero que ninguém passe por isso de novo. As pessoas querem crescer na internet, querem viralizar de qualquer jeito. Quando foi com a Filó foi de uma forma orgânica. Eu não esperava, foi tudo novo pra mim. Nunca esperei que iria viralizar, que isso ia acontecer. " O Ibama discorda. No processo contra o influenciador são citados números de seu crescimento nas redes sociais e até mesmo de entrevistas dadas por ele a canais de televisão. Tupinambá diz que ainda faz conteúdo com animais silvestres, mas de outra forma que considera correta. "Como eu moro no meio do mato, de vez em quando aparece uma cobra aqui na casa. Aparecem muitas aranhas. Na época eu fui multado porque eu tirei uma foto com uma aranha na mão. Hoje em dia acontece muito de aparecer, às vezes estou tomando banho e tem uma aranha no banheiro, no quarto. Fiz vários vídeos explicando que não são agressivas. Tocando no animal, mas para retirar de dentro de casa e levar para o seu habitar natural. É um vídeo bem legal para ensinar a galera a respeitar esses animais." Patrocínio de 'bet' e publicidade No mesmo ano em que ficou famoso nas redes, após a polêmica com a capivara Filó, Agenor conta que fechou um contrato anual com um site de apostas, que foi renovado e segue ativo. De início ele diz que pensou em não aceitar "pelo estado que estava, do que tinha passado", mas acabou assinando com a marca. Desde então passou a receber críticas de seguidores. Publicações mais recentes que citam a marca não permitem comentários. "Na verdade crítica a gente tem em tudo. Logo que eu comecei, sim, teve bastante crítica. Mas a gente tem público pra tudo. Outra coisa é, por exemplo, as pessoas que me seguiam e sabiam da minha orientação sexual. Sabiam que eu era gay. E depois que eu comecei um relacionamento, que eu comecei a assumir na internet, em dois dias eu perdi 300 mil seguidores. Acho que eu fui mais atacado por ser gay do que trabalhar para a Blaze [casa de apostas]." Uma das publicações sobre a aposta aparece destacada em seu Instagram ao lado de uma imagem também destacada de Filó. Mas Agenor afirma que não faz uso da capivara de forma direta, nas propagandas. "Já vieram muitas 'publis' pra eu fazer vídeo com ela, mostrar ela na 'publi', no vídeo. Mas eu nunca fiz nenhum vídeo usando a imagem dela pra ganhar dinheiro, nada. Nem uma 'publi'. Não vinculo ela a isso." Ele diz que não vê problemas nesse tipo de divulgação de apostas e que a responsabilidade é de que faz uso da plataforma. "Quando a gente divulga a Blaze, eu posto um vídeo antes dizendo que, se a pessoa tiver algum tipo de vício, ela não usar a plataforma. Eu não obrigo ninguém a jogar." Além da casa de apostas, ele conta que tem contrato com uma fábrica de laticínios e que faz publicações pontuais para marcas da região. "De vez em quando eu faço viagens para outro estado, a gente vai para alguns eventos. Tenho parcerias com marcas daqui da cidade, marcas pequenas, que eu também quero ajudar quem é daqui, da minha cidade." 'Um cara tentou matar a Filó' Embora a capivara esteja sob sua responsabilidade, Tupinambá afirma que mantém contato com a equipe da deputada estadual Joana Darc, que o apoiou à época da apreensão. Diz que deve informar qualquer problema com o animal, como doenças ou ferimentos. Em um dos episódios mais graves, segundo ele, um homem tentou agredir Filó com um remo, achando que era uma capivara selvagem. "Como eu falei ela fica livre, ela é solta. Ela estava na beira do rio e aí o cara passou, pensou que era uma capivara selvagem, foi lá, pegou um remo, um pedaço de pau e tentou 'cassetar'. E ainda conseguiu bater, só que ela correu. E aí meu pai chegou bem na hora e viu, pedimos pra parar e ele foi embora. Não aconteceu nada de ruim." Caso passou 'mensagem equivocada' à população, avalia analista do Ibama O analista ambiental do Ibama Roberto Cabral disse à BBC News Brasil que o desfecho do caso da capivara Filó é uma "mensagem equivocada" à população sobre o que pode acontecer com alguém que exibe animais silvestres nas redes sociais. "Se o Ibama tivesse tido a oportunidade de fazer a reintrodução do animal à natureza e mostrado às pessoas, isso traria a mensagem de que a lei ambiental é importante e que quem a transgride está cometendo um crime e responderá por isso. Mas ficou parecendo que ele [influenciador] não estava fazendo nada de errado. Do ponto de vista de uma mensagem ambiental, é muito equivocada." Cabral diz que o risco é que outras pessoas queiram seguir o mesmo caminho. "Elas percebem que ele se tornou mais famoso e que nada aconteceu." Ele acredita que ainda há uma visão equivocada em parte da sociedade de que a infração ambiental compensa. "Um jabuti no nordeste brasileiro vale R$ 10. Se você vender no Rio, vale R$ 100. Qual outro investimento te dá esse retorno? E se a pessoa for pega com o animal, não é presa." O analista vê o problema nas redes sociais como um novo tipo de circo, em que animais são expostos, seus donos ganham seguidores e monetizam com isso. "Em 2009 o Ibama fez uma grande ação de fiscalização em circos no Brasil e descobriu que nenhum deles cumpria todos os requisitos, avaliando questões como maus-tratos, segurança do público, sanitária e documentação de origem dos animais. Todos os animais foram apreendidos e os circos, autuados. Hoje redescobriram como fazer o circo, de forma virtual, onde eu exponho um animal e consigo seguidores, sem que as pessoas saibam o bastidor do circo." Ele defende que a devolução dos animais apreendidos para seus criadores pode causar um dano difícil de ser revertido depois. "Para o animal isso é péssimo. Quando ele é filhote, há uma vantagem do ponto de vista de conservação, pois é mais fácil que um grupo aceite aquele animal de volta. É mais fácil do que com um animal adulto. Quanto mais tempo demora pra reinserir, mais difícil." Defende ainda que a legislação já prevê que punições possam deixar de ser aplicadas ao infrator, caso a situação não seja grave, mas que o animal apreendido deve ser liberado prioritariamente no ambiental animal ou em zoológico, sob responsabilidade de técnicos habilitados. "Infelizmente temos visto várias decisões judiciais que mantêm o animal com a pessoa. É como o Detran descobrir que um carro foi roubado, mas a Justiça decidir que quem o comprou tinha boa fé e não apreender o veículo. Dificilmente isso aconteceria com um bem material." Cabral avalia ainda que um dos motivos pelos quais parte da opinião pública fica contra o Ibama em casos como esse é que há uma incompreensão sobre o que realmente acontece com os animais resgatados. "Os centros de triagem [para onde os animais vão depois de apreendidos] não são o destino final do animal. É lá que eles serão recuperados, onde se faz uma reabilitação. É como se fosse um hospital. Transitório, para preparar o animal para viver em liberdade." Como adolescentes abastecem mercado online ilegal de animais silvestres Por dentro do mercado ilegal de aranhas que movimenta milhões no Brasil: 'Febre na classe média' Como habitat de onças-pintadas do 'tamanho da Inglaterra' virou plantação de soja e pasto Capivara 'Filó' é devolvida a influenciador

FONTE: https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2025/05/26/influencer-da-capivara-filo-continua-com-o-animal-ganhou-seguidores-e-contrato-com-bet.ghtml


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